O Monstro da Lagoa

O colapso ambiental observado no verão do Rio de Janeiro não ocorreu por acaso, reflete por um lado o despreparo dos poderes

 O colapso ambiental observado no verão do Rio de Janeiro não ocorreu por acaso, reflete por um lado o despreparo dos poderes municipal e estadual para solucionar problemas ambientais, por eles mesmos produzidos, e por outro lado uma história perversa de agressões que passou por obras de aterros, drenagens, dissecação de ecossistemas e poluição entre outras.

 

   De forma oportunista, aproveitando a última mortandade de peixes, e o espaço na mídia, tentam impor uma obra projetada pela COPPE para a Prefeitura do Município do Rio de Janeiro de alargamento e abertura permanente do Canal do Jardim de Alah, orçada em cerca de U$ 40 milhões, que executada liquidará a Lagoa Rodrigo de Freitas como ambiente natural (embora impactado e situado em área urbana) e modificar significativamente as praias do Arpoador, Ipanema e Leblon.

 

   Por ser a Lagoa Rodrigo de Freitas um patrimônio público e a modificação irreversível de um ecossistema, ato ilegal, passível de enquadramento em diversos instrumentos jurídicos, inclusive a Lei Federal dos Crimes Ambientais (Lei 9605/97), as entidades ambientalistas da APEDEMA (Assembléia Permanente das Entidades de Meio Ambiente do Estado do Rio de Janeiro) através de suas coligadas e outras entidades, vem a público manifestar-se.

 

São previstos diversos impactos da obra de abertura permanente e alargamento do Canal do Jardim de Alah:

 

Aumento da salinização – A lagoa se tornará um braço de mar, passando a ser com ele permanentemente conectado. Com isto perderá a característica típica das lagunas costeiras de troca de águas doce/salobra/salgada. Em decorrência, desaparecerão todos os organismos típicos de água salobra. Os organismos remanescentes serão predominantemente de visitantes. Haverá impactos na pesca. O lençol freático do entorno da lagoa poderá ser salinizado afetando a vegetação do Jardim Botânico, do Parque Lage e de outras áreas. Os manguezais reintroduzidos na orla da lagoa (renaturalização) deverão ser afetados.

 

Rebaixamento do nível d’água da lagoa – Por estar o leito da lagoa acima do nível médio do mar, e com as obras, passar a estar com ele direta e facilmente conectado, responderá a todos os ciclos de marés. Com a maré baixa, amplas faixas do lodo do fundo ficarão expostas (estas áreas serão aterradas?, como vem sendo feito até hoje?). Situação parecida passou a ser observada nas lagoas de Piratininga e Itaipu depois da abertura do Canal de Itaipu. Os manguezais mais uma vez serão atingidos.

 

Criação de ilhas, bancos e/ou coroas – Com as obras haverá aumento da capacidade de transporte de sedimento que tenderá a ser redistribuído ao longo do canal e margens próximas.

 

O projeto prevê ainda a construção de um extenso molhe (a pretexto de proteção do canal permanente), que isolará as praias de Ipanema e Leblon e produzirá a “engorda” (aterros) das praias do Arpoador e do Leblon. Com o molhe será alterado o sistema de circulação e transporte costeiro ao longo da enseada. Serão criadas duas células distintas de circulação e transporte de sedimentos (areias). Áreas de erosão e de sedimentação surgirão induzidas pelas obras. Enfim o sistema natural de transporte de sedimentos será radicalmente modificado.

 

Com a engorda das praias do Arpoador e Leblon serão produzidos os impactos:

Alteração do perfil natural das praias. Alteração do padrão de ondas, afetando drasticamente o surfe no Arpoador, (berço nacional do surfe). Alteração do padrão de arrebentação das ondas, expondo pessoas a riscos. Impactos na área das jazidas das areias a serem utilizadas. Impactos na fauna. Impactos na área de jazida a ser utilizada.

 

   O retorno, poucos dias após a mortandade de peixes, da taxa de oxigênio nas águas da lagoa a níveis normais (sem as obras) prova que o ecossistema está vivo e que as GRANDES OBRAS QUE DANIFICARÃO IRREVERSIVELMENTE O ECOSSISTEMA SÃO DESNECESSÁRIAS.

 

   O grande volume de peixes mortos 130 toneladas (que já chegou a cerca de 500 toneladas na década de 70), que impressionou o governador Garotinho, revela por outro lado a elevada produtividade biológica típica dos ecossistemas lagunares.

 

   

O QUE PROPOMOS

 

·   Dragagem do lodo ativo do fundo da Lagoa 

·   Dragagem regular do Jardim de Alah  

·   Eliminação das ligações clandestinas de esgoto 

·   Tolerância zero à poluição 

·   Conselho gestor da Lagoa Rodrigo de Freitas democrática e paritária 

·   Monitoramento regular incluindo salinidade, temperatura, assoreamento e distribuição de organismos Efetiva fiscalização da FEEMA, SERLA e SMAC

·   Estudo de Impacto ambiental das obras de dragagem que venham a ser feitas

 

CREA-RJ – MOVIMENTO BAÍA VIVA – OS VERDES – BICUDA ECOLÓGICA – SAPLAM – SALVEMOS A BAÍA – AQUARIANA – GRUPO SOS LAGOA

AFEA – ONDAA – MOVIMENTO DE CIDADANIA PELAS ÁGUAS – APEFERJ

Rio de Janeiro, 19 março/2000

 

Texto reproduzido pela:  ASEAC – Associação dos Empregados de Nível Universitário da CEDAE